sexta-feira, 13 de março de 2015

#15deMarçoDe2015

panela

Panelaços e buzinaços sacudiram a noite do último domingo em diversas localidades do país. Enquanto a inquilina do Alvorada fazia um pronunciamento débil na TV, brasileiros muitos cravaram decibéis nas latas num protesto insuflado via redes sociais. No decorrer da semana em São Paulo, a presidente levou outra bordoada ruidosa das indignadas gentes.

Estas manifestações são prenúncios claros para o dia quinze vindouro.

E por que o Brasil vai pra rua?

Porque existe um justo repúdio ao bando de malfeitores que assaltou —ainda assalta?— desavergonhadamente o Estado brasileiro.

Porque uma sociedade vigilante —e barulhenta quando necessário— é pilar de um regime democrático.

Porque a Petrobras, patrimônio da nação, está sendo corroída por ações e omissões criminosas que destroçaram sua credibilidade e, consequentemente, seu valor de mercado.

Porque, pela vastidão de indícios e engodos sacramentados, é legítimo discutir política e juridicamente a capacidade de governar do mandatário maior da República.

Porque é intolerável que compromissos de palanque sejam rasgados com a maior cara-de-pau depois da posse.

Porque a participação política do povo não se resume ao ato de votar.

Porque os interesses de um partido político não podem ser misturados às políticas de Estado.

Porque protestar não é golpismo.

Porque ventilar sobre dispositivos constitucionais não é terceiro turno.

Porque liberdade de imprensa é outro pilar de nações democráticas.

Porque o Brasil é muito maior que a peleja tucanos X petistas.

Porque só fama não alça ninguém ao posto de gerente competente.

Porque a economia de um gigante precisa de um timoneiro que saiba navegar também em mares revoltos.

Porque Cuba e Venezuela têm muito de ditadura e pouco de liberdade.

Porque a contrariedade ao governo também está nas periferias e nos rincões do país.

Porque pedir mudança não significa vestir o traje da elite golpista, tampouco farda e bolsonarices alegóricas.

Porque existe corneta vigorosa —e livre— muito além da CUT e dos movimentos sociais.

Porque a vaca tossiu.

Em tempo: convicto estou dos propósitos da passeata como convicto estou da baixeza de protestar com linguajar de rasteiro calão e com desejos estúpidos de sangramento.

sábado, 7 de março de 2015

Walther

“Era briluz. As lesmolisas touvas roldavam e relviam nos gramilvos. Estavam mimsicais as pintalouvas. E os momirratos davam grilvos.”

Tradução de Jabberwacky de Lewis Carroll, por Augusto de Campos

Melódico, complexo, hermético, sonoro. São eles, o poema e o Walther.

Walther

Segundo post consecutivo, por Deus!, para lamentar a morte de um querido. Os Castelli, Walther e Nando, irmãos de sangue, se foram em menos de duas semanas. Chorei pelo Nando dias atrás e, ainda dilacerado, republico linhas de boas-vindas ao Walther, quando ele palestrou, em novembro de 2012, na Academia de Letras de São João da Boa Vista. Assim o recebi naquele sábado chuvoso.

""Noite festiva nesta fecunda Casa de Letras.

Uma efeméride em que tenho a agradável incumbência de apresentar e dar as boas-vindas ao palestrante Walther Castelli Júnior.

Agradável porque o Walther, além de sanjoanense, literato maior, orgulho da terrinha, é amigo desde sempre.

Desde a vizinhança na residencial Tereziano Vallim dos anos 1970, depois em Campinas, onde na minha adolescência era eu generosamente acolhido na sua república. República essa culturalmente bem movimentada, multifacetada, efervescente e, por isso, frequentada por pessoas bem estranhas aos olhos de um jovem provinciano.
Junto com o Nando, irmão caçula do Walther e meu camarada do peito, passei finais de semana inesquecíveis bebendo o caldo de novidades daquela casa agitada na Guanabara campineira.

Naquela época, confesso, eu bebia muito também, além das novidades, caldos mais etílicos.

E o generoso que eu digo é muito mais do que a simples hospedagem: Walther me apresentou a um mundo muito além das macaúbas. Através dele conheci, entre tantas coisas, o cinema de Godard, a música de Caetano, a poesia concreta, o porre de vomitar e a gastronomia japonesa.

O primeiro wasabi —aquele condimento extra-forte da cozinha nipônica que os incautos lambuzam no sashimi como se fosse patê— a gente nunca esquece.

Uma passagem da casa que gosto de rememorar. Tarde de sábado e o Walther chega trazendo uma fita K7. Ele pede a atenção dos presentes e dá um play no toca-fitas do três em um. O som era chatíssimo, incompreensível. Ante a cara de enfado de todos, ele mete o dedo no stop e explica aos entediados: “é poesia medieval!”

Sanjoanisticamente, não resisti e cochichei pro Nando: “Poesia medieval!? Puta que pariu!, seu irmão é inteligente por bosta!”

Dez anos mais novo que a geração do Walther, o macaúbico aqui, moleque intruso, não era muito ouvido pelos intelectuais amigos dele. Eu é que ouvia e aprendia muito.
Ultimamente nossos encontros têm sido no refúgio da sua família, aqui nos arredores de Sanja. Sob as bênçãos do mato platino-pratense, o Walther vai pro fogão a lenha reger memoráveis esbórnias de comida, bebida e prosa. E é claro que nessa prosa reinam reminiscências deste torrão da Beloca.

Filho da Therezinha Araújo, que os chegados conhecem como Tuta, e do saudoso Walther Castelli, Júnior, como a família o chama, nasceu em setembro de 1960.
Sedento por aumentar seus horizontes na estética da escrita, decolou de Sanja muito jovem.

Cursou Letras Clássicas e Vernáculas na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, a conceituada Fefeleche da USP; licenciou-se em Letras no Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas, onde desenvolveu dissertação de mestrado em Teoria e História Literária, estudando a obra de Dante Milano, sob orientação do Professor Dr. Paulo Franchetti.

De 1979 a 1996, atuou como professor de Língua e Literatura em instituições particulares de ensino médio e em cursos pré-vestibulares. E aqui cabe um parêntesis: em Itapetininga, na sala de aula de um cursinho, o professor Walther foi fisgado pela aluna Marinês. Casarem-se em 1995 e têm dois filhos, Mariana e Pedro. Fecha parêntesis.

Concluiu cursos de gestão de projetos editoriais ministrados no Brasil pelo Centro de Formación Publish, de Madri, e pela Bookhouse Training Center, de Londres.
Atuou de 1995 a 2012 como diretor editorial da Editora Companhia da Escola, de Campinas, que veio a se chamar posteriormente Integral Sistema de Ensino Ltda., onde desenvolveu também o trabalho de autoria de livros didáticos de Língua e Literatura Brasileira e Portuguesa.

É tradutor e comentarista, pela Verus Editora, de Campinas, da obra do educador americano John Holt, tendo traduzido os livros Aprendendo o tempo todo (Learning all the time), em 2006, e Como as crianças aprendem (How Children Learn) em 2009.

Bem sucedido nos negócios, Walther quer voltar a ter mais prazer no trabalho. Quer e vai ter. Aos 52 anos ele está voltando a fazer o que mais gosta: ler, escrever, lecionar, palestrar...

E nessa noite, creio eu, aqui em São João, na Academia de Letras, há um simbolismo de reencontro muito grande. O recomeço do Walther nas Letras é aqui, palestrando no pé da Mantiqueira, revendo amigos, família e trazendo um naco da poesia de Dante Milano aos presentes.

Zezinho Só, artista e arteiro, não economiza adjetivos ao falar do amigo: “Walther é o sanjoanense mais culto de todos os tempos”.""

Eu concordo e acrescento: culto, pai, marido, irmão, filho, amigo, genro, tio, poeta e generoso. Um ídolo. Uma referência. Do bem e do caralho! Warti, você partiu antes do combinado.