sábado, 29 de junho de 2024

Casa João de Barro

 

Durante a pandemia, muitas pessoas adquiriram o bom hábito de tirar os calçados antes de entrar em suas casas. Sapateiras, então, passaram a ser utilizadas para que os sapatos ficassem nos ambientes de entrada das residências. Mirando nesse nicho de mercado, num momento de crise, o arquiteto João Paulo Reinato se associou ao pai, Mauri, serralheiro reconhecido, para fabricar as peças. Beleza e qualidade impulsionaram as vendas do produto que mesclava harmonicamente ferro e madeira.


O negócio cresceu rápido e o portfólio foi ampliado para modelos múltiplos, domésticos e comerciais, de mobiliário. O estilo ferro e madeira permaneceu como marca da João de Barro Móveis. Desse incremento, veio o inevitável showroom. Clientes, encantados com o charmoso imóvel no bucólico Bairro Alegre, onde os móveis eram exibidos, sugeriam o tempo todo: “João, por que não agregar um café a esse espaço delicioso?”. 


A família encampou a ideia e o time foi reforçado. A mãe Ana chegou para comandar a cozinha. O brother Mauri Júnior também embarcou com a esposa Taciane no empreendimento, que ganhou um novo nome: Casa João de Barro. 


Na pitoresca comunidade distante do Centro de São João da Boa Vista, a casinha avarandada, cercada por um bem-cuidado jardim, abriga mais uma preciosidade desta Mantiqueira de tantas seduções. No cardápio, há o afeto artesanal nas formas de café coado, pão de queijo, brownie, cookie e generosas tostadas. Estas, são fatias de pães de longa fermentação cobertas com shimeji e cream cheese, ovos com bacon e, escuta isso!, banana, queijo e doce de leite.


Senti, ali, uma atmosfera caseira que exala aromas que abraçam e confortam. Senti sabores servidos por um clã que trabalha junto e valoriza a simplicidade poética do Bairro Alegre.


☕️ ☕️ ☕️

Casa João de Barro

Rua Maria Esther Campos de Alvarenga, 61

Bairro Alegre, São João da Boa Vista, SP

Sábados, das 8 às 12h e das 14 às 18h

Domingos, das 8 às 12h





segunda-feira, 17 de junho de 2024

LED Beer: o prazer do cereal líquido

Brewpub LED Beer em Águas da Prata

 Conheci o empreendedor que está neste texto por acaso. Seu brewpub em Poços, na Assis Figueiredo, me acolheu numa noite fria quando eu buscava uma sarjeta pra comer os hambúrgueres da Dona Dulce. Como minha hamburgueria preferida só opera no delivery, perguntei na cervejaria vizinha se eu e Josi poderíamos ali satisfazer nossa carência burgueira. Eles foram simpáticos, generosos e nos cederam mesa e cadeiras. Sentamos, bebemos algumas cervejas, devoramos os burgers do Felipão e engatamos uma longa prosa cervejeira até descobrir que também tem LED Beer em Águas da Prata. Segue a rápida história…

Poços-caldense, apaixonado por cerveja, pesquisador incansável da bebida, o engenheiro eletricista André Dias fez do hobby um negócio. Depois de doze anos trabalhando em indústrias, ele quis experimentar a tensão de uma corrente de cereais, líquida e bem mais prazerosa.

Em 2019, a LED Beer foi criada após exaustivos testes de receitas. A vontade dele foi e continua sendo popularizar a cerveja artesanal, colocá-la nos momentos tradicionais de confraternização, em bares, eventos, reuniões de familiares e amigos etc. “Cerveja boa, Lauro, tem que ser tomada em todas as ocasiões, ela não pode ser pouco acessível”.

André ressalta seu apreço pelas grandes escolas cervejeiras, mas a tradição não impede dele imprimir seu estilo: “Gosto das cervejas alemãs, americanas, belgas, tchecas, mas quero dar um toque brasileiro às nossas. Essa diversidade de frutas e aromas do país está também nas cervejas da LED. Além das clássicas cervejas do mundo, a cultura do Brasil está nos nossos rótulos”.

Cerveja sem comida? Não rola! A LED Beer oferece em seus brewpubs de Poços e Águas da Prata um enxuto cardápio de petiscos para acompanhar os mais de quinze tipos de breja. Tem torresmo, tem fritas rústicas, tem costelinha marinada na cerveja ao molho barbecue, tem linguiça. Tem ainda dois sanduíches maravilhosos cujas carnes do recheio também são lentamente cozidas na cerveja da casa.

Em tempo: a operação é comandada por André Dias, mas William Leal está junto como investidor na empreitada cervejeira. Também engenheiro eletricista e apaixonado pelo universo das brejas, ele (ainda) não deixou a carreira corporativa. 

🍺🍺🍺

Brewpubs LED Beer


👉🏻Poços de Caldas

Rua Assis Figueiredo, 376

Terça a sábado, a partir das 16h


👉🏻Águas da Prata

Rua Cel. Ernesto de Oliveira, 11

Sexta, a partir das 18h

Sábado e domingo, a partir das 12h


André Dias, dono da LED Beer

domingo, 2 de junho de 2024

Derrota ostraordinária

Curioso, indaguei à minha mãe sobre as conchas disformes que eram exibidas no recipiente do modesto ambulante que circulava sob um sol senegalesco. “São ostras, quer provar?”. Pelo tom de voz sem muito entusiasmo da oferta, percebi que as coisinhas estranhas nada apeteciam dona Ana Maria.

Aquele típico rompante adolescente me fez aceitar. O senhor de pés descalços e pele tostada da praia agachou-se à minha frente e, com extrema destreza manuseando uma pequena faca, começou a abrir meia dúzia de moluscos. Gotas de limão e uma pitada de sal ele jogou sobre a gosminha que repousava sobre a outra metade da concha. “Deixa escorrer na boca e engole, não precisa mastigar”, ensinou o tiozinho ao jovem sentado na areia, cabelo descolorido, sem medo do novo. Fui arrebatado instantaneamente por aquele inexplicável gosto de mar, gosto de desafio, gosto de uma estrada de sabores que eu começava a trilhar. Era Peruíbe, litoral sul paulista, meados dos anos 1980.

Desde então, batizado, comungado e crismado no paladar da iguaria, algumas centenas —milhares talvez— de ostras mundo afora eu devorei. Josi, que sempre se manteve distante delas, se deixou levar pelas caipirinhas na paradisíaca Praia dos Carneiros em Pernambuco. Era a Semana Santa de 2011. Ela sucumbiu a meus apelos e experimentou… uma, duas, três, quatro… Vivaaaaaa! Naquela sexta-feira sagrada, eu consegui evangelizá-la e ganhei uma companheira “ostraordinária” de esbórnias.

Praia dos Carneiros (PE), 2011: Josi prova ostras pela primeira vez

Num outono gelado, estávamos na Grand Central em Manhattan, esperando o trem para Norwalk. Como o comboio demoraria quarenta minutos para partir, entramos num Oyster Bar na legendária estação. No meio daqueles engravatados de Wall Street, consumimos no balcão, com cerveja e Aperol, uma dúzia delas. O que me chocou não foi o preço exorbitante da porção, mas o copinho de ketchup que os norte-americanos servem como acompanhamento do molusco. Ostras com ketchup, ianques? PQP!

Grand Central Station, Nova York, outono de 2018: ostras servidas com ketchup

No ano passado, o amigo Leandro Balloni, que gozaria um feriadão retirado com a família em Cananéia, perguntou se eu queria algo de lá. Só um ser insensível não liga ostras a Cananéia. Só um ser insensível não liga ostras a amigos que também delas gostam. Nem todos são parceiros “ostraordinários” à mesa, coisa que Luisinho Galli e Ellen são. E dos bons!

Leandro, meu querido, um casal amigo estará conosco na farra “ostraordinária”. Pode me trazer doze dúzias? Não quero miséria.

—Quantas?! [o timbre vocal dele transmitia incredulidade]

—Doze dúzias, isso mesmo, cento e quarenta e quatro ostras.

Fiz um grande preparo ferramental para a gloriosa noite de vinte e dois de novembro de dois mil e vinte e três. O Mercado Livre nos muniu de faquinhas e luvas específicas para o manejo de ostras. Mesa linda, gelo e vinho branco em abundância. Arriscamos até umas gratinadas.

Ellen, Luisinho e Josi no manejo: doze dúzias de ostras numa noite de 2023

A temperatura amena na Fonte Platina, a prosa solta, o Chardonnay, a MPB na Alexa, o caldo denso do bem viver. Vai daí que no embalo irresistível do encontro, dizem alguns dos três que comigo estavam, fui o autor do delito contra cinquenta delas. Prefiro contabilizar em dúzias e dizer que comi quatro, é menos agressivo, mais civilizado.

Nalgum momento daquela reunião, algo começou a se rebelar nas minhas entranhas. Silenciei, sofri quieto. Interações monossilábicas e visitas sucessivas ao banheiro entregaram aos companheiros meu lastimável quadro gastro-intestinal. Capitulei e tombei vergonhosamente nas quarenta e oito horas seguintes. A quantidade ingerida, alguma estragada no meio das boas, uma intolerância tardiamente adquirida? Não consegui identificar até agora o motivo de minha fragorosa e triste derrota.

Em janeiro deste 2024, voltei a Peruíbe. Relutante, no incrível restaurante Pau do Índio, cedi ao instinto e abocanhei apenas uma. Uma mísera ostra! Caí novamente, sob os idênticos estrondos abdominais de meses antes. Assumi minha humana fragilidade ante o molusco e, na mesma Peruíbe onde a paixão brotou, fiz votos de definitiva abstinência do prazer que me deleitou por quatro décadas. 


Restaurante Pau do Índio, Peruíbe, SP, janeiro de 2024: minha derradeira experiência com ostras