A sala da Vovó Elna |
Como os salmões da trama, fui capturado pela série “Ilha de Peixe Grande”, na Netflix. Gravados na Noruega, os seis episódios, bem produzidos, contam a história da disputa entre duas famílias poderosas pelo controle da indústria do famoso peixe de carne alaranjada. O atraente enredo é ambientado na fictícia Ilha de Brima. As locações escolhidas destacam lindas paisagens costeiras, a atmosfera da piscicultura e pequenas vilas que retratam o estilo de vida local.
Uma rápida curiosidade sobre o salmão norueguês, pescado nas águas do Atlântico. Na década de 1980, o governo do país nórdico implantou uma estratégia de marketing ousada chamada “Project Japan”. A iniciativa almejava introduzir o peixe no sushi japonês. Resistentes culturalmente, os nipônicos rechaçaram inicialmente a investida dos noruegueses. O salmão não era tradicionalmente usado nos sushis/sashimis do Sol Nascente. Com persistência e um oceano de dinheiro, a Noruega conseguiu cativar os japas, demonstrando as práticas rigorosas de sua aquicultura. Pesaram também, nessa conquista, argumentos gastronômicos: a cor vibrante e o sabor suave do salmão. Convenceram o Japão e o mundo, mas não me dobraram. Só troco o atum do meu sushi por prego.
Ver a Noruega na TV reavivou meus laços afetivos com essa terra que tem outra celebridade em seus mares: o bacalhau. Meu filho, pelo intercâmbio do Rotary, viveu lá por doze meses, entre 2007 e 2008. Foi acolhido no período por três famílias. Em junho de 2010, fomos, eu e Josi, conhecer o país na companhia do Laurinho. Aquele fim de primavera foi inesquecível na Escandinávia.
Laurinho morou em Lillehammer e arredores. Nossa base foi no Centro da cidade, no apartamento do saudoso Anton Beck. A localidade, de pouco mais de 25 mil habitantes, foi sede dos Jogos Olímpicos de Inverno em 1994. Cercada por montanhas e pistas de esqui de primeira linha, às margens do lago Mjøsa, Lillehammer, ao mesmo tempo, pulsa na emoção dos esportes de neve e relaxa na tranquilidade de um vilarejo setentrional. Ali, entre idas e vindas turísticas, passei dias quase como um nativo: era até reconhecido pelos funcionários do Kiwi, um popular supermercado dos boreais.
Em Oslo, a capital, boquiabertos ficamos ante as esculturas monumentais do Parque Vigeland, caminhamos no teto moderno da Ópera Nacional e até “ouvimos” o icônico “O Grito” de Edvard Munch. Aquela expressão de angústia do quadro até hoje ecoa nas profundezas da minha alma.
Impossível ficar imune àquelas grandiosidades naturais em que formações verticais mergulham em águas límpidas que espelham o céu: os fiordes. Impossível ficar imune à inacreditável arquitetura curva da Storseisundbrua, a ponte mais incrível do planeta. Impossível ficar imune à justiça social e ao bem-estar geral proporcionados pela riqueza petrolífera.
Gostei muito da vivência norueguesa como turista, mas foi o laço terno com clãs locais que nos levou a uma experiência única em Fåvang: a casa da Vovó Elna, uma pequena propriedade rural onde o tempo parecia desacelerar. Entre paredes rústicas de madeira, ela nos brindou com waffles dourados, fresquinhos, acompanhados de mel e geleia feita de framboesas do seu pomar. Ali, naquele recanto que abraçava com hospitalidade e simplicidade, sentimos o afeto genuíno que turista comum jamais vai sentir.
Vovó Elna e seus inesquecíveis waffles |