domingo, 17 de agosto de 2025

Pesto: a saborosa epifania vulcânica

 

No calor caótico da cozinha,

talento e afeto criam deleites.

Panelas murmuram, pratos emolduram,

e (re)descobrimos

que há lugares em que o paladar

toca a alma com a alquimia dos temperos,

a harmonia das cores

e a diversidade das texturas.


Grande empresário, viajante planetário e aficcionado da boa mesa, Phil Melo abriu o Pesto em 2019 — movido pelo desejo de oferecer a Poços uma amostra dos sabores que garimpou mundo afora. A proposta inicial mesclava comida saudável com leve espírito de cafeteria. A casa ia bem, embora ainda não fosse exatamente aquilo que ele idealizara. Eu, particularmente, tampouco me afeiçoei ao conceito: fomos uma vez e a decepção foi inevitável. No meio da pandemia, Phil decidiu reformular o projeto, introduzindo um menu mais requintado, inspirado nas referências colhidas aqui e além-mar.


A alta gastronomia desembarcou de vez quando o restaurateur encontrou, em 2021, Juscelino Silva Barboza — cearense de Guaraciaba do Norte, que fincou pé no Rio aos dezoito anos e forjou sua carreira entre as panelas de alguns dos mais renomados restaurantes da Cidade Maravilhosa. Em busca de mais qualidade de vida para a família, o chef começou a frequentar a região por influência dos familiares da mulher, donos de um sítio em Caconde. Entre uma visita e outra, encantou-se por Poços de Caldas — pela caldeira vulcânica, pela atmosfera serrana e, claro, pela proposta de Phil. Vestiu o dólmã do Pesto com a autoconfiança de quem sabe o que faz e passou a executar — e recriar — os pratos que o businessman conhecera em suas andanças nacionais e internacionais.



A aposta deu certo: o restaurante rapidamente se consolidou neste pedaço fronteiriço do sul de Minas com o leste paulista, tornando-se também expoente da coquetelaria de alto nível — uma redenção sápida após um início carente de identidade.

Atarefado com suas múltiplas frentes de negócios, Phil percebeu que já não conseguia dedicar ao Pesto a atenção que a casa merecia. Enxergou, então, em Fábia Batel a pessoa talhada para assumir o restaurante e seguir escrevendo sua história. À frente da fantástica — e lentamente fermentada — Panedota, fornecedora dos pães do Pesto, Fábia já conhecia os bastidores do empreendimento, tinha sensibilidade gastronômica e vocação nata para o bem receber — atributos fundamentais para lidar com uma clientela que reúne nativos, regionais e turistas. Num primeiro momento, ela se assustou com o convite. Mãe de dois pequenos — Maria e Thomas — e consumida pela padoca artesanal, hesitou. O incentivo decisivo veio do marido, Thiago: “Vai lá, aceita. Essa oportunidade é o reconhecimento da sua trajetória”. Destemida, ainda que com um friozinho na barriga, ela assumiu oficialmente a comedoria neste inverno de 2025.


Perguntei a Fábia como ela define o restaurante: “Servimos o que é diferente e gostoso. A cara do Pesto é não ser convencional, mesmo nos itens clássicos. Queremos que nosso cliente tenha aqui uma experiência que ele só teria em grandes centros”.


Ela — tendo o brilhante Juscelino como parceiro de travessia — desbrava novos terrenos, sem medo, e escreve, com cadência e fluência, mais um saboroso capítulo de sua jornada em Poços de Caldas.


Numa gelada quinta-feira de agosto, eu e Josi desfrutamos, no Pesto, de uma imersão das mais arrebatadoras da nossa trilha de peregrinos culinários — daquelas que permanecem acesas no paladar, na memória e na alma.


Alguns itens do nosso antológico jantar: um tartar defumado em que cenouras e beterrabas, abençoadas por fumaça, se deitavam sobre maionese de abacate picante e pão de longa fermentação; avançamos para o atum selado com foie gras e purê de limão-siciliano — feito apenas da polpa —, coroado por flor de sal ao vinho.


Nos entregamos depois ao gnocchi de batata e parmesão, envolto em molho de queijos, poeira de cogumelos e trufas frescas generosamente laminadas ali mesmo; finalizamos com o lombo de pirarucu defumado em cascas de laranjeira, cozido no sous-vide e servido com mil-folhas de banana-da-terra, creme de moqueca, farofa de castanhas e espuma de açaí.



E saímos de lá, no pós-repasto, com a certeza de que, no calor manso deste vulcão adormecido, o Pesto segue transformando fogo, afeto e talento naquilo que a gastronomia tem de mais essencial: momentos que eternizam o instante.

clique aqui e assista o vídeo de experiência


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