O frio desperta necessidades de consumo no guarda-livros Orlando. A japona azul-marinho da loja do Zeca Italiano é a cobiça dele para usar nos meses de inverno.
Munheca notório, seu espírito sovina é mais forte que o impulso de comprar o agasalho. Zeca Italiano não vai ver a cor dos caraminguás de Landinho, que vai enfrentar a friagem vindoura com as jaquetas puídas de mil novecentos e guaraná com rolha.
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Nada contido é o compulsivo desejo de Landinho pelos júbilos carnais. À boca pequena comenta-se nas esquinas sobre as estrepolias extra-conjugais dele com a sirigaita Neide Bisturi.
Dia destes, a recatada Ivonete, esposa, cobriu-o de chapoletadas e safanões, quando a ceroula manchada de batom entregou mais uma pulada de cerca do marido herege.
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Colérica pra dedéu pelas recorrentes infidelidades, Ivonete radicalizou na punição ao cônjuge: a radiola que Landinho herdou do pai foi impiedosamente destroçada a marteladas.
Assustado com o banzé causado pela ira destruidora da furiosa mulher, ele conjectura:
—Ela deve estar lelé da cuca.
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No balcão da venda do João Garrucha, os gorós libertaram o verbo de Landinho:
—Nenete se desmazelou muito de uns tempos pra cá. Ela anda muito marmota, mal-ajambrada à beça, passa o dia com os zóio remelado, com o cabelo sebento. Muié assim não faiz vontadi no homi. A Neide dá gosto de ver, é uma cabrocha batuta, perfumada, tá sempre supimpa, elegante…
—Vorta! A nossa patota vai te dar razão, Landinho.
—Pombas!, João Garrucha, cê sabe que, tirando a minha muquiranice, eu sô um homi bão. Não entendo patavinas por que a Nenete relaxou desse jeito.
—Você abre a mão pra Nenete se arrumar?
—Então…
—Pois é, então…
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Landinho matutou, matutou, matutou e decidiu ser menos apegado ao próprio cascalho: negociou em três parcelas a japona azul-marinho da loja do Zeca Italiano. Também comprou um ramalhete de flores, uma caixa de bombons e um anel.
Ainda não se sabe se os mimos foram para Nenete ou para a alcova pecaminosa de Neide Bisturi.
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