domingo, 22 de setembro de 2013

Habibi, Tenda do

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Pego a rodovia rumo à província poçoscaldélica buscando alívio no incomodamento causado pela quentura climática.
E vou também para reencontrar os deleitamentos apetitosos do chef Rafael Moisés, esse neto de libaneses que realiza com primor temperístico a cozinha milenar dos seus ancestrais.

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A Tenda do Habibi, cravada no coração da agitada e charmosística urbe mineira, está mais bem fornida de detalhismos estéticos, mas continua fiel às origens ofertando aos comensais pratos deliciosos em porções generosas, visualmente sedutores, acompanhados de um atendimento simpático.

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E todo esse conjunto de corretismos no bem servir não avança com ganancismo nos seus níqueis. O preço é justíssimo.
A sugestão para uma sequência de mastigamentos jubilantes: quibe cru sob cebolas caramelizadas, babaganoush, uma sagrada coalhada seca com figo ramy, charutinhos e, o gran e dulcíssimo finale, doce de semolina, uma sobremesa de encantamento inergaláctico feita de sêmola de trigo, ameixas, ovos, assada lentamente para manter a cremosidade, e que aterrissa à mesa submersa numa sutil calda cítrica.

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Confetes e confetes, Rafael, e que o seu entusiasmo pelas tentações paladarísticas perdure por mil gerações.

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https://www.facebook.com/tendadohabibi

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Carlos, Henrique e Jorge

foto P&A_PB-PARA JORNAL

Nos ramos paterno e materno da família de Carlos havia cafeicultores. Até a vida acadêmica, no entanto, nunca se interessou pela cultura do grão que sustentava vários da sua casta.

O avô de Henrique foi o médico, daqueles devotados clínicos gerais das antigas, Dr. Paschoal. Apaixonado pelo ofício e por literatura, quando morreu deixou nos arquivos do consultório as fichas de mais de dez mil pacientes. Milhares também foram os livros deixados por ele, que tanto fascinaram o neto na infância e adolescência. A biblioteca ecumênica do ascendente era mais sedutora que as brincadeiras de rua.

Comerciante, o pai de Jorge foi um visionário. A Casa Brasileira, fundada nos anos 1950, foi uma precursora do que são hoje as lojas de departamento. No estabelecimento, Rogério vendia de aviamentos a ferramentas, passando por presentes, papelaria e uma infinidade de utilidades domésticas e miudezas.

Na tradicional —e pública— escola Cardeal Leme, Carlos cursou da primeira série ao fim do hoje chamado ensino médio. A professora Joanna Di Felippe o marcou. Marcou pela compulsão com que enchia a lousa de lições —ela não usava cartilhas— e pela vara de madeira que, entre outras serventias, repreendia pupilos relapsos.

Corajoso, Henrique muito provavelmente foi um dos pinhalenses pioneiros em programas de intercâmbio. No ano letivo 1968/69, uma família do estado norte-americano do Colorado o acolheu no último período da high-school. Dos EUA trouxe experiência de vida, fluência no inglês e a afeição dos que o hospedaram.

A província ficara pequena demais para os anseios universitários do jovem Jorge. Na excelência da Politécnica da Universidade de São Paulo, com brilhantismo, granjeou o canudo de engenheiro civil.

Por algum tempo, Carlos labutou no torrão natal. Ora com empreendimentos imobiliários na iniciativa privada, ora com planejamento urbano no setor público. Ainda, lecionou Hidráulica e Irrigação na Faculdade de Agronomia, onde conviveu com professores visitantes do renomado Instituto Agronômico de Campinas, o IAC. De pesquisas desta instituição campineira saiu a maior variedade de cafés plantados no mundo.

Henrique nunca perdeu a ambição por conhecimento em plagas estrangeiras. Atraído por um anúncio publicado no Estadão, voltou à América como o único brasileiro selecionado para um programa de estudos no MIT —Massachusetts Institute of Technology. Neste ultra-conceituado centro educacional, recebeu, após um ano, o convite para fazer doutorado. Na época, por conta do curso, a cada dois meses viajava ao Egito, onde ficava quinze dias engordando sua bagagem acadêmica estudando e propondo soluções para as mazelas urbanas da nação africana.

Amigo dos donos da Máquinas Pinhalense, Jorge, nas férias, auxiliava-os como intérprete no contato com clientes gringos. Mais que um tradutor, ele era um atento observador. Observava e falava com o estofo cartesiano de um diplomado pela Poli: “A empresa fabrica com competência, mas não tem muita visão para a realidade dos países compradores”. Das críticas assertivas veio a proposta para criar/organizar o departamento de exportação da companhia. Os equipamentos da empresa, à época, estavam presentes em 12 territórios além-fronteiras. O apuro da área técnica em conceber e aperfeiçoar equipamentos que revolucionavam o beneficiamento de café aliado a uma eficiente [nova] área de comércio exterior seria determinante para a expansão da Pinhalense. E foi. Hoje os produtos made in Pinhal estão espalhados em noventa países nos cinco continentes. Mais da metade do café consumido no mundo passa por pelo menos uma máquina Pinhalense.

Carlos Henrique Jorge Brando, fragmentado nos parágrafos acima num tosco exercício literário do signatário do blog, é o cara de currículo invejável responsável por mudar e modernizar processos de beneficiamento de café em grandes países produtores.

Em 1995 saiu da empresa, mas permaneceu na missão através da P&A, uma cria para prestar de forma terceirizada o que ele fazia de carteira assinada. Mais que um vendedor de máquinas, Carlos Brando passou a ser participante ativo do agronegócio e, por consequência, aprofundou sua dedicação para dominar ainda mais o conhecimento em todas as etapas de produção e comercialização do café.

Palestrante requisitado pelos principais eventos cafeeiros do mundo, Carlos Brando multiplicou os negócios. O grupo comandado por ele tem 30 colaboradores que pensam café 24 horas por dia. Vende máquinas e consultorias, exporta cafés especiais, torra e distribui um produto extra-qualidade no maior centro gastronômico do Brasil. Uma das quatro empresas da holding é a GSB2, uma agência de propaganda especializada em café.

Do seu seleto grupo de colaboradores sai um boletim mensal bilíngue —inglês e espanhol— que atinge sete mil pessoas ligadas ao ramo nos cinco continentes. Quando o assunto é café, Carlos Brando é fonte de importantes veículos de mídia planetários: seu nome é citado com frequência pelo Financial Times, pela Reuters, pela Bloomberg...

Ainda, sabe-se lá como, arranja tempo pra ser membro de vários conselhos, governamentais ou não, que discutem e norteiam o métier.

Seguro, ponderado, generoso, Carlos Brando rejeita individualismos e credita o êxito negocial ao trabalho da equipe.

Instável, doidivanas, egoísta, o autor destas linhas enxerga méritos incontestes no serviço dos sócios e funcionários, mas não pode se abster de reverenciar a sumidade cafeeira personificada no pinhalense Carlos Henrique Jorge Brando.

E arremato, indagando como um forasteiro: Espírito Santo do Pinhal reconhece como deveria os feitos extraordinários deste filho ilustre?