quinta-feira, 30 de outubro de 2014

O “jornalismo” engajado de Veja

capa de veja

Antes de tudo, para esclarecer quaisquer eventuais acusações de motivações político-partidárias, revelo: votei com convicção em Aécio Neves.

Escolhi o tucano por várias razões, a saber: a necessidade da alternância de poder —um partido governar por dezesseis anos não é saudável em nenhuma democracia do mundo—, o desavergonhado aparelhamento do Estado por filiados e militantes petistas, a gestão temerária e politizada na Petrobras, os rumos erráticos na economia do país e o desastre que é a política de relações exteriores da gestão Dilma —apoiar com farto dinheiro do contribuinte brasileiro a ditadura cubana e manter relações estreitas com, seja lá que diabo é isso, o populista socialismo bolivariano na Venezuela. Isso sem falar na proposta de diálogo com o grupo, ou melhor, quadrilha, nominado Estado Islâmico, que são esses radicais muçulmanos impiedosos que decapitam sem piedade cidadãos de países ocidentais e compartilham as barbaridades na internet. E, claro, a corrupção entranhada e institucionalizada nos porões de ministérios e empresas estatais.

Votei em Aécio, sim, mas repudio o “jornalismo” tendencioso da revista VEJA. Não vejo mal nenhum no fato da publicação manifestar em editoriais e através dos seus colunistas opiniões reacionárias e anti-PT, mas no território sagrado das matérias/reportagens isso é inadmissível e tira qualquer credibilidade do veículo. Isso é canalhice. Torpeza, pra dizer o mínimo, foi a capa da revista no fim de semana do pleito do segundo turno. Primeiro, anteciparam a circulação da edição e fizeram um marketing agressivo com a capa que aludia a um suposto conhecimento prévio de Lula e Dilma do escândalo na Petrobras. A informação foi baseada num hipotético testemunho do doleiro Alberto Youssef, criminoso confesso, enjaulado e com confiabilidade nula.

Se comprovado o alegado por Youssef, aí sim o Congresso tem o dever político de pedir o impeachment da presidente da República.

Em 1989 já testemunhamos tentativas espúrias de manipular o eleitorado: a edição picareta, feita pela Globo, do debate Lula X Collor. Nos telejornais da emissora, o collorido de Alagoas massacrou o petista, o que não correspondeu à realidade da contenda verbal. Também, na mesma eleição, a polícia quercista de São Paulo apresentou à imprensa os sequestradores do empresário Abílio Diniz trajando camisetas do PT.

Outrossim, não compactuo com o vandalismo perpetrado contra a editora Abril pela militância petista, bem como a tentativa da campanha de Dilma para retirar a revista de circulação. Censura não, nunca, jamais. Tratem a VEJA pelo que ela é, assumidamente: um panfleto ideológico que propaga uma doutrina conservadora de direita que representa parcela significativa da população brasileira. A Constituição consagra a liberdade de expressão.

E, voltando para a província crepuscular, me lembra o episódio Laert na última eleição municipal. Na capa do maior jornal da cidade, O Município, foi publicada, no sábado anterior ao sufrágio, em manchete de primeira página uma enquete de pastelaria pró Laert. Verdade, sem metáforas, uma enquete de pastelaria desprovida de qualquer metodologia.

Palavras do Luís, amigo e dono da Pastelaria do Renato: "Fui usado pela assessoria do candidato. Jamais deixarei que usem novamente meu nome e do meu negócio para fins eleitorais".

Nos dois casos, da VEJA e d’O Município, um tiro desesperado nos próprios pés.

Em tempo: falei da VEJA pela grande tiragem da revista e pela visibilidade, mas tem muitos órgãos de imprensa —revista Carta Capital, é um exemplo— e blogueiros, como Luís Nassif e Paulo Henrique Amorim, que fazem o mesmo jogo sujo a favor do PT.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Folheando

folha manchete

Um amigo de longa data, Luís Pio Magalhães, sabedor do meu apreço pela Folha de São Paulo e pelas crônicas do Xico Sá, instou-me a comentar o pedido de demissão do cronista. Explico: Xico, na sua última coluna, não publicada, declarou o voto em Dilma. O jornal, pela diretriz editorial, pediu que o texto se adequasse ao Manual de Redação —que veta o proselitismo político dos seus contratados— e ofereceu-lhe outro espaço (Tendências/Debates, página 3) para a publicação da lavra controversa. Como as partes foram irredutíveis, Xico pediu o boné e saiu gritando nas redes sociais.

Respondi ao querido Luís, com cópia para Vera Martins, ombudsman da Folha. Assim o fiz:

Meu amigo, tirando algumas pândegas e galhofas do Zé Simão e congêneres, não vou falar de eleição no Facebook. Prometi a mim mesmo esta abstinência depois de reler o discurso de posse do meu ídolo, Carlos Heitor Cony, na ABL, do qual destaco um trecho que muito me apraz:

"(...)Não tenho disciplina mental para ser de esquerda, nem firmeza monolítica para ser de direita. Tampouco me sinto confortável na imobilidade tática, muitas vezes oportunista, do centro. Tenho me tornado um vago anarquista, um anarquista entristecido, humilde e inofensivo(...)"

Fragilidades reveladas e idolatrias reiteradas, arvoro-me a falar um naco sobre as duas paixões mencionadas no primeiro parágrafo.

Com a Folha o caso é mais antigo —uns 35 anos. Comecei a paquera lendo as tirinhas da Ilustrada na casa da minha avó, Fiuca. Do Xico, me recordo de lê-lo pela primeira vez na Folha nos idos de 1996, cobrindo a morte de PC Farias. Um Xico sério, repórter fuçador, nada a ver com este genial cronista de cotidiano do presente. Óbvio que ele já tinha a veia cômica e apimentada. Ela, à época, só estava oculta pela pauta mais cinzenta do primeiro caderno. Ainda era um foca, acho eu, um foca que já mostrava argúcia.

Depois que descobriram seu talento para os motes futebolístico, sexual e futiba-sexual, junto, surubado, swingado, o homem saiu do Baixo Augusta para o Brasil. O homem que se inebria na fila da padaria com a "morena linda, cabelos molhados, cheirando Neutrox". O homem que hoje tá na Globo lançando devassos comentários no talk-sex da Fernanda Lima.

No caso em questão, a Folha pisou na bola e pisou porque negou-lhe um produto caro à cesta básica da existência: a liberdade de expressão no seu quintal. “Cesta básica da existência”, diga-se, é da grife do Xico.

Vários colunistas do jornal explicitaram ou sinalizaram seus votos nesta eleição. Na segunda-feira, Gregório Duvivier declarou seu voto na candidata petista em coluna na Ilustrada. Janio de Freitas, Antonio Prata, Ricardo Melo, entre outros, são muito claros no posicionamento pró Dilma/PT. Ao contrário, Reinaldo Azevedo, Demétrio Magnoli, Ferreira Gullar, fazem o contraponto a favor dos tucanos.

A diversidade de correntes me cativa na Folha. Muito. A militância do PT nas redes sociais —tão chata e marrenta quanto a dos corintianos— é useira e vezeira em ensacar a Folha junto com a Veja e a Globo. Errado. A Folha erra, sim, mas é exceção. Erra e assume, quase sempre. Ser um veículo plural, crítico e apartidário é a marca do jornal, diferentemente de todos os grandes veículos do país.

Há 25 anos a Folha trouxe para o Brasil o conceito de ombudsman. Conceito e prática. O ocupante tem estabilidade no cargo e sinal verde para baixar o porrete nas editorias. É a voz do leitor dentro da redação para criticar o próprio veículo. O ombudsman não foi fogo de palha de marqueteiro. Há 1/4 de século bate sem dó em quem lhe paga o salário. E pode ter certeza que a demissão do Xico vai estar na coluna dominical da ombudsman.

Entre poucos erros, esse do Xico Sá foi doído, e muitos acertos, ainda vejo a Folha engajada na campanha das Diretas em 1984, bandeirando pela eleição de Tancredo Neves em 1985. Foi o primeiro veículo da grande mídia a mencionar PC Farias e nadar contra a onda farsesca do collorido caçador de marajás; denunciou a fraude na licitação da ferrovia Norte-Sul, acusou a compra de votos parlamentares na gestão FHC para aprovar a reeleição. Em 2005, publicou a entrevista-bomba de Roberto Jefferson que fez eclodir o mensalão. Luís Nassif, quando na Folha, foi a primeira voz a questionar o linchamento dos donos da Escola Base. Mais: aeroporto do Aécio, dentadura na eleitora da Dilma, lambança na Petrobras. Tem no time Juca Kfouri, o jornalista esportivo mais sério e combativo do Brasil, enfim, um jornal que se posiciona nos editoriais, que faz cobertura isenta, que tem cores múltiplas, que ouve o outro lado, que investiga...

Eu leio, sigo, critico, odeio e adoro a Folha. A partir desta semana, mais triste sem o Xico, mas ainda assim, a FOLHA.

Em tempo: a ombudsman, Vera Martins, assim respondeu ao escriba: Caríssimo Lauro, a esta altura do campeonato, é um bálsamo receber uma mensagem como a sua. Você está certo em sua certeza: o pedido de demissão do Xico vai estar na minha coluna de domingo. Abraços e até lá.”

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Vanderbilt & Rockefeller

noiva
Depois de treze anos de um conturbado namoro, o empresário Carlos Alberto Vanderbilt, o Betinho da Borracharia, contraiu núpcias com a balconista Sandra Regina Rockefeller. No caso, o verbo contrair teve uma conotação mais ampla. Acometida de terrível conjuntivite, a noiva, ao trocar alianças, estava com os olhos rubros, lacrimejantes e remelentos. Este colunista apurou o estrago no day after: padre, noivo, daminha e quarenta e sete convidados foram contaminados.
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Prevenida com a possibilidade de infecção em massa, Sandrinha incluiu nas lembrancinhas, além do tradicional bem-casado, uma caixa de lenços de papel e um frasco do colírio Moura Brasil. Este colunista apurou o embuste no mimo medicamentoso: era água.
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Foram inevitáveis os mexericos na entrada da noiva. Ela trocou a marcha nupcial por “How Deep Is Your Love”. Não é segredo na cidade que, antes de conhecer Betinho, Sandrinha se relacionou com Johnny Goiabada, integrante da banda Doces Caseiros, cover dos Bee Gees. Este colunista apurou que os dois outros músicos da Doces Caseiros são Frank Abóbora e Bob Marmelada.
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Na recepção, a ala de parentes do noivo estava revoltada com o menu escolhido por dona Filomena, mãe de Sandrinha: risoto de frutos do mar. Um motim, liderado pelo primo Frederico, chegou a ser ventilado. O protesto fora motivado por aquilo que eles chamaram de “arroz empapado com sardinha”. O primo Leopoldo fuzilou sarcasmo: “Sandrinha combina com sardinha”. Este colunista apurou que, ao contrário do colírio, o risoto não era engodo. A família Vanderbilt conhece nada de gastronomia e muito de fuxicos.
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Dona Agadir, sogra, se insurgiu contra o vestido da nora: “Indecentemente decotado, vergonhoso”, cochichou para a irmã. “Meu menino não merece essa moça de reputação duvidosa”, ainda lamentou. Este colunista apurou que, de fato, o figurino era um tanto ousado nas fendas e transparências.
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Senhoritas casadoiras disputaram no corpo a corpo o tradicional buquê arremessado que, pasmem!, foi agarrado pela ágil —e casada— Gisela Silva Guggenheim. O burburinho correu o salão. Antenor, o marido, aumentou o bas-fond ao bradar carraspanas impublicáveis à ligeira Gigi. Este colunista apurou que o senhor Guggenheim só foi amansado horas depois, entre quatro paredes, pelas peripécias libertinas —e também impublicáveis— da mulher.
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Os noivos sonharam com uma lua de mel em Itanhaém. Os planos praianos foram frustrados em razão da baita grana injetada na festa. Cinco dias em Pocinhos do Rio Verde só foram possíveis graças aos caraminguás arrecadados com os picotes da gravata. Este colunista apurou que Betinho padeceu de insucessos eréteis nos dois primeiros dias da viagem. A partir do terceiro, aleluia!, a coisa engrenou e Sandrinha deu-se por satisfeita com o desempenho do rapaz.
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Sigilo da fonte é um princípio basilar para a prática do bom jornalismo. De antemão, este colunista bisbilhoteiro invoca-o.