sábado, 21 de outubro de 2023

Vovó Darly


 Os meninos saíram de Minas, mas Minas jamais saiu deles. Rodaram o Brasil na vida corporativa, conheceram novos sabores em novos lugares. Não encontraram, em canto algum, o pão de queijo das mães, avós, tias, madrinhas, vizinhas… Cléber Júnior reencontrou o amigo Thiago Gonçalves em São João da Boa Vista para concordarem que o país, salvo mineiras e outras honrosas exceções, não come pão de queijo; o que se vê por aí, segundo suas memórias afetivas, são biscoitos com leve sabor de queijo. Trocaram receitas da iguaria e perceberam que a da dona Darly, mãe de Cléber, era bem parecida com a da avó de Thiago, dona Zilda. Dessa saudade misturada com o espírito de empreender nasceu a marca Vovó Darly, brotou a pequena fábrica que, dignamente, preserva fielmente uma receita de família e resgata um paladar recôndito das montanhas de Minas Gerais.

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Ao provar o pão de queijo Vovó Darly, hoje no café da manhã, fui transportado à casa da tia Mariana em Goiânia, nos anos 1970/80. A irmã da minha vó Fiuca provia generosamente a molecada faminta com baciadas do melhor pão de queijo do planeta.


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Vovó Darly

Vendas/entregas em São João da Boa Vista e Águas da Prata

📲 31 99498-3628



quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Jabuticabas: paixão tardia

Desci agorinha do Coqueiro Torto com o embornal carregado daquelas negras frutinhas da safra 2023 do meu sogro. Jamais tinha visto e sentido tamanho diâmetro e dulçor numa jabuticaba caipira. Não sou daqueles que têm memórias de infância e juventude chupando jabuticabas no pé. Tampouco tenho no meu pobre currículo traquinagens de moleque para angariar jabuticabas em pomares alheios. Gostava da fruta, saboreava-a eventualmente, mas não era nenhuma paixão. Na última década, desde quando Zé Lino decidiu se refugiar na montanha à sombra de jabuticabeiras, fui arrebatado pelas neguinhas. Aprendi tardiamente a estourá-las sob o pé, fazendo o garimpo nos galhos mais baixos, circulando no solo como um orangotango faminto, mas cuidadoso, que evita colocar seu colossal peso sobre a frágil árvore. Josi, que é versada desde sempre no prazer delas, escala fácil o tronco e se equilibra nas alturas para colher as mais bonitas. Bem verdade que minha cúmplice na gula jabuticabesca tem feito uso de uma escada para alcançar as quase inalcançáveis, mas isso não tira a poesia dessa Jane adoçando a boca do seu roliço Tarzan. 




domingo, 15 de outubro de 2023

Trattoria Zia Nina

Poços sempre surpreende! Uma casinha de esquina elegantemente repaginada cujo estilo com notas art déco remete aos anos 1940/50. Tangerina, para abrir o apetite, é a cor da pintura externa. A varanda chama, as plantas recepcionam e a madeira do piso e dos largos portais abraça. Decoração cuidadosa, charmosa, sem exageros. Cássia Mariano, esposa do legendário Walter (Cantina do) Araújo, comanda com competência e simpatia a novíssima Trattoria Zia Nina. A carta, óbvio, tem o DNA da Bota. O cardápio é cantineiro, informal, mas com alguns toques de requinte. O essencial é que o faminto come bem, amansa seus instintos e ainda tem o prazer de se alimentar num ambiente que agrada aos olhos. Nossa experiência: o respeitável trio (tomate, shimeji e abobrinha) de bruschettas inaugurou o repasto; o clássico fettuccine Alfredo com um impecável medalhão de filé ao molho madeira foi o prato principal. A sobremesa? Sobre farofa doce e creme chantilly, um fake limão siciliano moldado com bolo de limão e brigadeiro de limão. Quer levar seu vinho? A rolha custa modestos R$ 30,00. Que noite, gulosos e gulosas, que noite!


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Trattoria Zia Nina

Rua Barros Cobra, 440

Poços de Caldas, MG

De terça a sábado, almoço e jantar

Domingo, só almoço 




quinta-feira, 12 de outubro de 2023

Leiteria Santa Paula


 A produtora Paula Florence Vergueiro tinha, certa feita, quatrocentos litros de leite na iminência de estragar no interior de um resfriador queimado. “Eu não podia perder aquilo tudo. Preparei um infinito de bolinhas super cremosas, temperadas com alho, ervas, pimentas e mergulhei-as no azeite. Nunca mais parei de fazer”. Esse é o queijo Fermier, xodó da marca Leiteria Santa Paula.

A arte queijeira, aos poucos, foi atraindo Paula, que era consumida pela duríssima lida de administrar a ordenha de dois mil litros diários de leite. A Danone perdeu um leal fornecedor, mas o mundo da gastronomia ganhou singulares tesouros lácticos.


Hoje, ela e seu negócio estão instalados em um pequeno sítio na SP 342 (São João-Pinhal). Do impecável laticínio saem queijos artesanais, sem conservantes, frutos de técnicas peculiares de fabricação. O Névoa (adorei o nome e o sabor) é um tipo camembert, massa bem cremosa envolta por uma fina camada de mofo branco. Tem Névoa, tem Nuvem, tem Fermier, tem queijo fresco, coalhada, manteiga, doce de leite…


Todos os dias, sem folga, a Leiteria Santa Paula abre sua lojinha de fábrica e seu menu de café da manhã/tarde em que o cliente pode provar todos os queijos do portfólio. É um café na roça com muuuuito queijo!

 

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Leiteria Santa Paula
SP 342, km 221,5

São João da Boa Vista, SP
Todos os dias, a partir das 8h
📲 19 99776-8645





quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Boteco Dom Caneco - Leblon

Silvio Angerami, Fernando Palomo, Murilo Halla e Cícero Zanetti na rua do Ouvidor, RJ

 Os jovens amigos Silvio Angerami e Fernando Palomo ainda não tinham trinta anos quando decidiram empreender no solo natal. São João da Boa Vista, SP, testemunhou em 2011 o nascimento do Dom Caneco, um bar/choperia no centro da cidade que agitou a noite interiorana. No antigo e charmoso imóvel remodelado todos os públicos convivem ao sabor de um belo cardápio de bebericos, petiscos, sandubas e pratos. Caminhando para doze aniversários, o Dom Caneco está mais do que consolidado na cena gastronômica de São João e região.


Era 2019. A esquina mais famosa da mesma São João da Boa Vista estava desocupada. No mesmo lendário prédio onde o Bar Canecão marcou época na província nos anos 1970/80/90, Silvio e Fernando, depois de uma certeira reforma, fizeram renascer a casa que jamais saiu da memória afetiva da cidade. O Canecão foi ressuscitado. O bauru de lombo voltou a reinar na Dona Gertrudes.


E São João ficou pequena pra eles...


Inquietos e apaixonados pelo Rio de Janeiro, os dois meninos da terra dos Crepúsculos Maravilhosos estão fincando a bandeira Dom Caneco no Leblon. O ousado investimento em plagas cariocas tem novos parceiros: Victor Hakim, Murilo Halla e Cícero Zanetti acreditaram e embarcaram no projeto, que abre as portas homenageando o samba, o Carnaval, o espírito informal e descontraído da Cidade Maravilhosa. E a bagagem de mais de década botecando em São João vai ser exportada para o Rio; itens autorais da carta sanjoanense serão protagonistas também no trincando de novo DomCa Leblon. Tem bloco da Beloca pedindo passagem na rua Ataulfo de Paiva. Caraca, mermão!

 

🍺🍸🥩🧀

Boteco Dom Caneco

Rua Ataulfo de Paiva, 1314

Leblon – Rio de Janeiro, RJ

Inauguração: 20 de outubro

 

segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Ame Mizu Hortaliças


 A Fonte Platina tem disso: um bairro urbanizado, cabeado com fibra ótica, cercado por matas, cachoeiras e pequenas propriedades rurais. Por vezes, na área asfaltada da comunidade, surge um empreendimento que mistura o melhor destes dois mundos. Kátia Kato, como boa descendente de japoneses, fez a vida em Mogi das Cruzes labutando em cultivos próprios de orquídeas, legumes e ervas. Cá neste torrão há alguns anos, ela abriu neste 2023 uma organizada estufa de cultura hidropônica. Verduras e hortaliças lindamente lavradas num trabalho solo e detalhista de Kátia. Tem zelo, tem amor, tem saúde e não tem nenhum defensivo químico. O atraente verde dos alimentos esbanja viço nestas montanhas onde a cidade é abraçada e energizada pela exuberância da natureza.

🥬🥦🫑

Ame Mizu Hortaliças

Vendas/visitas agendadas

Rua Raul Rabelo de Andrade, 163

Fonte Platina - Águas da Prata, SP

📲 11 99972-4437

Riquewihr


 Na incrível Rota dos Vinhos da Alsácia, entre tantas joias medievais, está Riquewihr. Foi nossa primeira parada na região, e foi a que mais me encantou. Seus 1.200 afortunados habitantes vivem da viticultura e do turismo. A beleza é tanta nesse lugar histórico cercado por vinhedos que veio de lá a inspiração para a cidade do filme da Disney, A Bela e a Fera. Não há uma atração específica em Riquewihr, a riqueza está no conjunto, nas ruas de pedras, nas fachadas coloridas e floridas, nas lojinhas, nos acolhedores restaurantes, no bouquet das videiras, no flanar sem pressa.

domingo, 1 de outubro de 2023

A melhor panificação do planeta

 

Boulangerie em Saint-Hippolyte, Alsácia

Mais do que ícones franceses, croissant e baguete são também ícones da minha extensa lista de paixões gastronômicas. Das quatro hospedagens do nosso recente tour na França, três tinham ao menos uma boulangerie (padaria) bem próxima. Sem objeção dos companheiros de viagem, assumi a missão de visitar as padocas todas as manhãs. E como eu gostei dessa “árdua” tarefa. As padarias de lá são essencialmente padarias; não há espaço para consumo no local, não há outros itens além de pães, bolos e eventualmente doces típicos da confeitaria francesa. Além de croissants e baguetes, que nunca faltaram no nosso desjejum, vez ou outra provávamos brioches ou outro tipo de pão. Nada, absolutamente nada superou a essencialidade perfeita da dupla —croissant & baguete— que há muito já ganhou o mundo. A Boulangerie de Quartier em Paris tinha um atrativo a mais: fila. Por causa dela, santa espera!, eu ficava uns bons minutos a mais contemplando e literalmente sentindo aquele universo maravilhoso da melhor panificação do planeta.


Boulangerie de Quartier, Paris

Boeuf bourguignon

 

Ainda sobre comida francesa. Na minha primeira vez em Paris, faz tempo, procurei nos guias da época um bom boeuf bourguignon. Elegi o que me parecia melhor e fomos, eu e Josi, provar esse clássico da Borgonha. Na primeira garfada, minha mulher reclamou: “a carne de panela que eu faço é muito mais gostosa”. De fato, aquela carne lentamente cozida no vinho com muitos vegetais e condimentos estava bem aquém da nossa expectativa. Semanas atrás, em Dijon (capital da Borgonha), comemos novamente a iguaria, e também num restaurante recomendado. Esta segunda experiência foi bem melhor que a parisiense do passado. Gostamos realmente do prato, mas tenho comigo que ainda não comi o boeuf bourguignon da minha vida. A saga continua!

Comer na Alsácia

 

Perguntaram-me sobre comida na região da Alsácia. O território foi durante séculos motivo de guerras entre França e Alemanha. Entre idas e vindas, o pedaço só voltou definitivamente ao domínio francês em 1944. Vai daí que culturalmente o estilo alemão é meio que dominante por lá, nos nomes das cidades, na arquitetura e na culinária. Nos cardápios dos restaurantes alsacianos, reina o chucrute acompanhado de salsichões e carnes suínas esbranquiçadas. Não morro de amores por esse prato. Outra especialidade da Alsácia é a tarte flambée, uma espécie de pizza feita com massa ultra-fina, assada no forno a lenha, coberta na receita clássica com queijo, cebola e bacon. A tarte flambée é gostosinha, mas tem pouco a ver com aquela cozinha francesa tradicional, cheia de técnica, molhos apurados e elaborações. Também não morri de amores pela tarte flambée. Da mesa alsaciana, eu quero é mais dos excepcionais vinhos brancos.

Is-sur-Tille

 

Depois do passeio e algumas garrafas de vinho na bela Dijon, a hospedagem seria de apenas uma noite em Is-sur-Tille, pequena cidade de pouco mais de quatro mil habitantes. Chegamos ao local do pouso bem tarde. Um pouco assustados ficamos com a ausência total de iluminação pública. Mais susto: os dormitórios da habitação nos pavimentos superiores só podiam ser acessados por estreitas, ruidosas e precárias escadas de madeira. Naquele lugarejo da Borgonha, luz e sinal de vida vinham de um único bar aberto. Eu e Jorge, carentes de água e Coca-Cola para atenuar os efeitos etílicos, fomos ao botequim. O dono, naquela altura despido da função empresarial, bebia alegremente no balcão acompanhado por um freguês. Estávamos todos um tanto altos. Tão altos que o dialeto universal dos botecos nos fez descobrir que o proprietário era um marroquino e que o freguês estava indignado com a ida de Neymar para a Arábia Saudita. Cogitei introduzir naquela prosa surreal perguntas sobre formas de preparo do boeuf bourguignon. A sobriedade que me restava foi suficiente para não colocar em pauta um assunto tão saborosamente denso. Era quase meia-noite, eu e Jorge tomamos o rumo de volta com nossas vozes ecoando naquela ruela escura e deserta daquela pacata aldeia francesa.


Fachada da nossa hospedagem em Is-sur-Tille