segunda-feira, 18 de março de 2024

Carne, fogo, sal e serra


 Amigo de décadas, o elétrico Kico Pessanha comanda o Carnes Mantiqueira desde o último trimestre de 2021. Em razão da morte do pai, tempos atrás, ele passou a ser o gestor maior da longeva empresa familiar que produz artigos para festas. Numa convergência de relações, circunstâncias e vontades, o empresário aterrissou no mundo da alimentação conhecendo pouco as particularidades do segmento. Nada que não pudesse ser suprido por curiosidade, inquietude, experiência no universo corporativo e sensibilidade em gestão de pessoas. Kico pegou fácil a coisa. Ou nem tão fácil, sei lá, mas o fato é que hoje ele domina o negócio.

Jantamos juntos noite destas. O repasto magnífico e nossa prosa eram interrompidos a todo momento. Antenado, Joaquim Pessanha Filho, 51, recepciona clientes, se despede deles, quer saber se tudo correu bem, orienta o time, organiza reservas, beberica chopes. Nunca sem ser gentil de uma maneira genuinamente sincera.

Carnes Mantiqueira é um conceito integrado de culto à carne. O açougue que tem uma steak house ou uma steak house que tem um açougue? Não importa, o que verdadeiramente importa é a qualidade suprema das carnes. O gado Angus da Fazenda Pratinha, hidratado com água mineral de Águas da Prata e alimentado com pastagens de solo vulcânico, reina soberano no açougue e na grelha char broiler do restaurante. Eles servem o melhor do pedaço quando o assunto é carnes marmorizadas.

E falando mais especificamente da steak house: o freguês pode escolher um corte do açougue e tê-lo à sua frente, lindamente grelhado, por uma modesta taxa de preparo. Tal como a proteína Angus destaque do cardápio, a maioria dos ingredientes tem o frescor local desta incrível Mantiqueira de tantos relevos e sabores. A riqueza e os aromas da região, orgulhosamente, estão nos pratos e nas taças do feliz comensal.

Este voraz e carnívoro cronista não pode deixar de mencionar, também, a grandeza do trabalho dos chefs Gui Ramos e Evandro Holanda. A dobradinha carne com pastas da casa, que eles fazem com rara perfeição, é algo que dignifica a boa mesa desta crepuscular província de São João da Boa Vista.

A propósito, nunca comi lá uma carne além ou aquém do (meu) ponto. É um respeito argentino, digamos assim, aos cortes Angus. Das pastas artesanais de produção própria, vou levar pra toda a vida a lembrança de um ravioli recheado com cabotiá e queijo meia-cura. Das carnes tenho poucas lembranças, só lembro-me da picanha, da fraldinha, da maminha, do contra-filé, do cupim, da costela, do neck steak, do miolo de acém, do bombom de alcatra, do tomahawk, do flat iron, do…


🥩🥩🥩

Carnes Mantiqueira

Av. Dr. Duval Nicolau, 2538

São João da Boa Vista, SP

Restaurante🍴
Almoço: terça a domingo
Jantar: sexta e sábado

Açougue 🥩
Terça a sábado, das 8 às 18h30

Domingo, das 8 às 14h


Inessa Carneiro e Josi Borges

Com o elétrico Kico Pessanha


domingo, 10 de março de 2024

Alma flecheira


 Nalgum dia da década passada, 18h30 em Poços, eu me abastecia na Panedota com as essenciais baguetes de levain. O horário do jantar se aproximava e comer na cidade era uma opção. Pedi à Fábia Batel, exímia padeira, uma dica de taberna para satisfazer meu apetite e minha necessidade de conhecer lugares inéditos. Ela não vacilou: “O Armazém da Vila, não tem erro, é a sua cara. Ah!, antes da refeição, o aperitivo pode ser no botequim que fica colado, a três passos, o Chico Biella”.

Minha fé em indicações para comer é cega. Tomei o rumo da Vila Cruz, um dos primeiros bairros de Poços, forjado com o desembarque maciço de imigrantes espanhóis. No século vinte, a elite do Centro da urbe alcunhava pejorativamente os habitantes da Vila Cruz de “flecheiros”, numa alusão jocosa a índios de tribos distantes. Hoje, o cidadão flecheiro se orgulha de suas origens, bate no peito e faz questão de ser assim chamado.

Astrud Gilberto nos recebeu com bossa nova no boteco. “Água de Beber” rolava gostoso na playlist. Rolaram também as sugestões do garçom: chips de jiló, coxinhas (a melhor da galáxia!) e caipirinha de três limões com rapadura. A tasca flecheira da avenida Champagnat flechou meu coração. O Chico Biella, intencionalmente ou não, trouxe um quê do espírito carioca à beira do vulcão.

A mesa ao lado, n’O Armazém, ficava também despojadamente na calçada. Vanessa da Mata cantava suave a minha dúvida ao passear pelo cardápio: “O Que Será?”. Foi spaghetti ao alho e óleo com steak au poivre. O êxtase foi tal que raras vezes me permiti ser apresentado a outros itens da carta. A definição da cozinha heterodoxa d’O Armazém da Vila? Não tem, mas eu arrisco: cozinha contemporânea e ecumênica que congrega as crenças do dono.

E quais são as crenças do dono? Não ser chamado de dono é uma delas. Novamente, eu me atrevo e divago: Flávio Molinari é o cara que está de passagem por lugares bacanas, juntando, aprimorando e compartilhando suas experiências e prazeres. Reservado, ele resiste ao protagonismo pessoal e prefere os holofotes voltados para sua comida, sua proposta e seu restaurante. Ok, Flávio, perdoe-me então minha breve indiscrição.

Filho de restaurateurs, a afinidade com as panelas veio do negócio dos pais e da independência que a mãe lhe concedia para preparar seus próprios repastos. Quando voou com as próprias asas no métier, de alguns tombos brotou a vontade de montar um bar de vinhos. “Era minha paixão desde os dezesseis anos, eu queria um espaço pra curtir o vinho de forma descomplicada.” Era O Armazém da Vila nascendo em 2016. Depois veio o Chico Biella e a Hamburgueria Villa Lobos, todos no quarteirão flecheiro da Champagnat. O sujeito boêmio que estuda música desde a infância —reza a lenda que ele já tocou clarinete com um trompetista n’O Armazém— e que adora charutos, discretamente, vai escrevendo nas páginas das enciclopédias de Poços um conceito ímpar de fazer e servir rangos. E a saga continua…

Vinícius Beretens, andradense, operário do mercado financeiro e residente em Poços, foi outro impiedosamente flechado pela esquina d’O Armazém. Habitué da casa, tantas foram as idas, que a amizade com Flávio decorreu das conexões recíprocas e das bençãos de Bacco. “Vamos abrir um restaurante italiano?”, provocou Vinícius.

Vai daí que no nada flecheiro cruzamento da rua Mato Grosso com a rua Ceará, o porão repaginado de um magnífico casarão centenário abriga o novíssimo e promissor Polenta, cuja culinária italiana tradicional tem no cardápio um respeitável rol de pastas e antepastos. Aquela Bota fundamental da mamma, de afetos e emoções, abraça no Polenta com uma arquitetura esplendorosa, elegante, ornada com arte e referências à pátria da lasagna. Mas o que envolve mesmo é a clássica receita, o prato generoso, o carbonara, o puttanesca, o matriciana, o cacio e pepe, o molho bolognesa, o pecorino, o guanciale, o parmegiano, o prosciutto, o tomate, a manteiga, o azeite, o pão, a sardela, o vinho, a polenta...

Enfim, naquele ambiente sofisticado de um imóvel aristocrático, o que sai das caçarolas tem a alma flecheira dos fogões domésticos, tem a beleza simples das ceias lautas que nutrem, aquecem, reúnem e encantam. 


🇮🇹🍝🧀🍷
Polenta
Rua Mato Grosso, 121
Poços de Caldas, MG
Quarta à sexta, das 18 às 23h
Sábado, das 11 às 23h
Domingo, das 12 às 16h





steak tartare com polenta frita




domingo, 3 de março de 2024

Gerações, aromas e paixões

 

Laurinha Tassi e Otávio Leite


Camerino Togo Nogueira da Silva e seus irmãos, Greenhal e Maurity, abriram, na década de 1950, a Casa Minerva de Secos e Molhados. Na esquina da Assis com a Prefeito Chagas, o estabelecimento abastecia a elite poços-caldense com aquilo que a crônica do passado chamava de mantimentos. Sacos de estopa, dispostos à frente do balcão principal, exibiam aos fregueses feijão, arroz, açúcar, fubá, farinha, entre outros. Vinhos e latarias eram expostos em prateleiras.


Não só a necessária ração diária era alcançada na Casa Minerva. Intelectuais, poetas e escritores também frequentavam o armazém para descontraídos dedos de prosa. Não sei dizer o que embalava o falatório, mas arrisco com grande chance de acerto: cachaça. Política da cidade, futebol, adultérios, furto de galinhas, amenidades, nada deixava de ser pautado nos colóquios acalorados da freguesia do senhor Camerino. Em 1960, a venda passou para novo endereço: rua Barros Cobra, também cruzamento com a Assis. Funcionou até baixar as portas definitivamente em 1976.


Bisneta pelo lado materno do legendário Camerino, Maria Laura Tassi é engenheira de produção diplomada pelo Mackenzie. Exilada em São Paulo no começo deste século para os estudos, ela, depois de formada, ficou na metrópole labutando por mais dez anos em um banco.


Em meados de 2016, as raízes chamaram e a capital paulista ficou para trás. Associada ao mano João Francisco, Laurinha ergueu um prédio comercial no mesmo terreno onde morou o patriarca Camerino. No número 253 da rua Barros Cobra, a Casa Minerva renasceu. Era fevereiro de 2019.


A proposta inicial, um empório requintado nos moldes da Mercearia Líder, tinha um diferencial: massas de produção própria e algumas mesas para degustação no local. Saladas, bruschettas, petiscos, frios e queijos fatiados na hora e antepastos. O atraente cardápio e a confecção das pastas tinham a assinatura de um jovem chef: Otávio Leite.


Abre parênteses. Otávio foi apresentado a Laurinha por um amigo comum. À época, ele trabalhava no Ollivia, cuja cozinha era comandada pelo talentosíssimo Henrique Benedetti. Ele, Otávio, considera o período no Ollivia e a mentoria do chef Benedetti os grandes estímulos que definiram sua vocação entre as panelas. Fecha parênteses.


Clientes mais assíduos da nova Casa Minerva começaram a pedir massas preparadas na hora e alguns itens fora do menu. Aos poucos, o restaurante foi ganhando corpo e tomando o espaço da mercearia.


Corta para 2024. Conhecemos a Casa Minerva no sábado do último Carnaval. Poços bombava com música e foliões nas praças enquanto aquele trecho da rua Barros Cobra estava espantosamente tranquilo. Facilidade para estacionar e uma refeição em slow motion, era o que buscávamos. Foi o que encontramos. Descobrimos mais, descobrimos um baita restaurante em que o trabalho do chef aparece no conjunto e nos detalhes, nos aromas e na apresentação, no preparo e na harmonização.


Vou narrar a experiência de nossa segunda visita aos domínios do casal Laurinha e Otávio. Sim, um casal, o tempero do cozinheiro encantou em demasia a proprietária.


Tentem sentir isso. Entradas: trio de bolinhos (costela com gorgonzola, cremoso de milho e coxinha de pernil com queijo Canastra); cream cheese sob geleia de pimentão amarelo e vermelho servido com torradas de ciabatta. Principal: robalo grelhado com camarões ao molho bisque servido com arroz de castanhas; filé mignon alto com crosta de ervas servido com tortelli de cogumelos. Sobremesas: petit gâteau de goiabada com sorvete de queijo; brownie com mousse gelado de chocolate branco. Bebidas: chopp Stella Artois, aperol spritz, mojito e tupiniquim (cachaça, manjericão, limão e xarope de cumaru). Tudo lindo e estupidamente gostoso à temperatura de civilizados 22ºC.


Em cada prato elaborado servido, Laurinha honra o nome Casa Minerva, homenageia o bisavô e reverencia o legado familiar de gerações passadas que fizeram História no comércio de Poços de Caldas. 

 

 🥩🍤🍹🍸🍨🍮

Casa Minerva

Rua Barros Cobra, 253

Poços de Caldas, MG

terça à quinta, a partir das 16h

sexta a domingo, a partir das 11h30

 

Em tempo: o grupo Citur, que administra sob concessão os principais pontos turísticos de Poços de Caldas, fez uma coletânea do melhor da cidade para replicar nas alturas, no novíssimo Mercado do Cristo; o belíssimo trabalho do chef Otávio Leite foi reconhecido e a Casa Minerva também está no topo de Poços.





domingo, 25 de fevereiro de 2024

O triunfo da borda tostadinha

Analu e uma de suas obras

Em Poços, frequentei o Katharino no começo deste século. Bar bacana, mainstream, lugar para ver e ser visto. Vou usar jargões da época para definir o público “katharinense”: mauricinhos e patricinhas. Tenho nenhuma lembrança do cardápio da casa, ou melhor, tenho uma única: o show pirotécnico que era a banana flambada preparada à mesa do freguês. O salão parava ante o espetáculo.


Ano passado, redondas e napolitanas razões levaram-me de volta à rua Santa Catarina. Ali, na esquina com a XV de Novembro, encontrei uma cena noturna bem diversa do extinto Katharino. Descobri uma Poços off-turismo, underground, colorida, alternativa. Ambiente multifacetado e ultrainformal. A cerveja artesanal (Borderbrew) é bebida ao ar livre, na calçada de piso irregular, enquanto playlists nada ortodoxas embalam os goles da etílica e democrática clientela.


O Bar XV de Novembro, botequim de estética old fashion, conserva o layout de priscas eras, mas o novo dono e jovens frequentadores estão em sintonia com a atmosfera plural do entorno. A taberna serve aqueles espetinhos do tipo churrasquinho de gato, cujo cheiro exalado faz o vivente perder a compostura.


O gentil atendente que mata minha sede na Borderbrew, Bruno, contou-me mais uma do pedaço: “Ovelha Negra é um pub bem legal. Rolam vários estilos de rock. Som no talo e uma discotecagem da hora”. Acho ousada e admiro a ideia, mas ainda não tenho o espírito liberto que me faça ser o tiozão roqueiro da pista. Pra ser sincero, nem sei bem o que é uma “discotecagem da hora”.


Voltemos então às redondas e napolitanas razões do segundo parágrafo. Elas são obras de Ana Luísa Scala, pizzaiola poços-caldense forjada em São Paulo na fantástica Iza Padaria Artesanal. Ela, vejam só, é filha dos donos do mencionado e extinto Katharino. “Eu meio que cresci inserida nesse meio”, assim Ana Luísa me responde sobre o estímulo para empreender no ramo gastronômico.


Era fim de 2022. Ela e o namorado Thom carregaram o carro em Sampa com forno, batedeira e outros utensílios. A proposta era fazer pizzas em pequenas reuniões privadas na cidade natal dela. Antes de caírem na estrada, o veículo estacionado na rua foi arrombado e todos os equipamentos foram furtados. Mantiveram o plano, mas recomprar o arsenal perdido foi necessário. As prestações das reaquisições foram pagas com a renda dos eventos que pipocaram com sucesso.


O êxito foi tal que abrir a pizzaria decorreu naturalmente. Tão natural quanto a longa fermentação e as bordas tostadinhas das impecáveis redondas da Furto Pizza. Sim, esse é o nome da rústica e despojada porta da menina Analu, que voou para estudar Gastronomia, cresceu e voltou às origens para assar espantosos discos napolitanos que fascinam todas as tribos.


🍕🍕🍕

Furto Pizza

Rua Santa Catarina, 663

Poços de Caldas, MG

De quarta a domingo, a partir das 18h 


 


domingo, 18 de fevereiro de 2024

É levain, uai!

 

Mineira de Viçosa, Carolina Riverin Cardoso mora em São João da Boa Vista desde 2014. Durante a pandemia, ela aperfeiçoou uma antiga paixão: fazer pães de fermentação natural. Os cursos on-line contribuíram teoricamente, mas a mão na massa foi o que elevou o trabalho dela a um nível excepcional. O que nem todos sabem, prestenção!, é que Carolina é doutora em Química.


A fermentação natural tem várias leveduras que se comportam de formas diferentes. Vai daí que ela, microscopicamente, entende melhor o processo e sabe fazer as correções necessárias para que das reações químicas resultem melhores pães. Então, seria difícil dar errado essa fórmula que mistura a alma das Minas Gerais, a cozinha afetiva e um profundo conhecimento técnico. Fico aqui a imaginar o que seria um pão de queijo dessa mineira, amante e estudiosa da panificação e PhD em Química. Deve ser um trem de bão!

🥖 🍞 🧪 📚 

Pão Rústico

Encomendas: 19 99644-7546

📔 ✏️ 

>> Italiano rústico

>> Italiano com açafrão e calabresa

>> Italiano com cacau, recheado com gotas de chocolate e nozes

>> Italiano multigrãos

>> Filão recheado com azeitona

>> Pão de milho

>> Focaccia de tomate

>> Cinnamon roll

>> Grissini

>> Massa de pizza

HaoChi — Jajangmyeon



O programa da Netflix impressionou-me pelas lindas imagens e pelo conteúdo histórico do prato coreano de origem chinesa. Mas o que mais me impressionou, uia!, é que a iguaria de nome impronunciável mostrada eu já conheço de São João, eu já conheço do HaoChi. Por razões que aqui não cabe discutir, você que lê o post tem alguma predisposição a nem experimentar qualquer comida que seja um pouco fora do convencional ou de alguma etnia culturalmente distante da nossa. Eu só peço: prove o jajangmyeon ou qualquer outro prato do HaoChi e depois venha aqui me contar. Pasta preta de feijão (ou soja) com carne combina com macarrão oriental frito? Combina muuuito, pode acreditar!

🇨🇳 🇰🇷 🇯🇵 🇻🇳 🇹🇭

Av. Durval Nicolau, 445

São João da Boa Vista, SP

De quarta à sábado, das 18 às 23h

19 99397-8825

sábado, 10 de fevereiro de 2024

Panedota


 A casa antiga no Centro da cidade é daquelas sem recuo frontal cujas grandes janelas praticamente integram rua e interior. Conheci o lugar em meados da década passada, por indicação da amiga, padeira e arteira Dri Torati. Desde então, raras são as vezes em que passo por Poços sem trazer os fantásticos pães da Panedota. Mais ainda: há dias em que subo a serra exclusivamente para abastecer-me das baguetes de lá. Baguetes, diga-se, que têm nome e formato francês, mas é a Itália que inspira textura, massa e sabor.

Ex-advogada, a hoje artista da panificação artesanal Fábia Batel consolidou a padoca brincando sério com levain. E da brincadeira (leia-se milhões de testes) com fermento, farinha, outros ingredientes, clima e temperatura de forno, saiu um saudavelmente mutante portfólio de delícias. Além da queridinha baguete, este fonteplatiner e glutão incurável pode mencionar croissant, brioche (hoje comi um com creme de queijo meia-cura e pupunha), focaccia, galette, cookie, brownie… Quer mais? Vai lá, porque naquele ambiente cheio de graça, que tem um dos melhores aromas do mundo, também há mesinhas pra curtir café e paladares in loco.



🥖 🍞 🥯 🥐 🍪

Panedota

Rua Barão do Campo Místico, 34

Poços de Caldas, MG

De segunda a sábado, das 11 às 18:30



Pedal & Açaí

 

Diletante ciclista que sou, mais instagrammer do que atleta, conheci o Guigo na oficina que funcionava na Washington Luís, ali onde hoje é o Armazém Dezoito86. O cara, além de ser conhecedor de bikes e de tudo o que cerca o mundo do pedal, é gentil, fala bem e tem uma rara noção de bem atender a clientela. 


Guigo é o pratense Luis Carlos Batista, cinquenta de idade e trinta e dois de bicicletaria. No meio da pandemia, ele mudou de endereço e expandiu o negócio. No mesmo espaço, agora, o freguês compra um câmbio Shimano e se delicia com o melhor açaí. A esposa Gisele, cuja família tem know-how na manipulação da fruta amazônica, carrega a cultura de preparar a pasta sem qualquer espessante ou aditivo químico. Misturado ao xarope de guaraná, o sabor é encorpado, bem diferente dos aguados encontrados por aí. 


Tem quem goste de Nutella, leite condensado, Ninho e outros paranauês. Não é o meu caso, açaí do Lauro só combina com morango, abacaxi e banana. Ah!, e também combina com um pedal bem leve.


🍒🚴🍒🚴

Estação Açaí Prata & Reference Bike

Av. Armando Salles de Oliveira, 93

Águas da Prata, SP

19 99766-9910 e 19 99473-2969

Oficina do Adauto

 

Apaixonado por carros, o descendente de suecos Carlos Backström fundou em 1926 aquela que é uma das oficinas mecânicas mais antigas de São João da Boa Vista. Se não foi a primeira, certamente foi a que funcionou por mais tempo. O lendário estabelecimento da avenida Tereziano Valim, também foi comandado por Valdemar, filho de Carlos, quando o pai adoeceu.


Em 1943, chega para trabalhar na oficina o homem que marcaria para sempre a província dos Crepúsculos Maravilhosos. Então com dezesseis anos, Adauto Eduardo Falavigna foi contratado por Valdemar Backström para aprender o ofício de manter e reparar motores veiculares.


O jovem aprendiz ganhou mais do que uma profissão. Adauto conquistou também o coração da filha do patrão. Em 1956, Izamar subiu ao altar com o já experiente mecânico. Tiveram três filhos, Adauto Filho, Cecília e Ricardo. Com mais de duas décadas na labuta, em 1967, Adauto comprou definitivamente o negócio.


Criado na graxa e no meio das ferramentas, o primogênito Adautinho conseguiu ser ainda mais precoce do que o genitor. O menino começou a fuçar nas máquinas aos doze. E não parou mais.


Adauto pai, o maior são-paulino deste torrão macaúbico, deixou sua Variant azul para um dos netos e foi consertar trenós celestiais em 2022, depois da façanha de suar por setenta e nove anos ininterruptos na oficina da Tereziano Valim.


Neste fevereiro de 2024, quando a empresa completa noventa e oito verões de funcionamento, o ciclo se encerra. A família decidiu vender o prédio e, Adautinho (foto), sessenta e quatro no lombo, até o último freguês honrou as quatro gerações que marcaram a história do comércio nestas margens do Jaguari. A Oficina do Adauto, digna, triste e irreversivelmente, está de portas baixadas. 


segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Da Fonte Platina ao Alaska

 

Alice, bióloga, viajante e sonhadora, iniciou o projeto em 2020, quando comprou a Kombi e começou a reformá-la. Ariela, arquiteta e também bióloga, chegou em 2022 na vida de Alice, embarcou na ideia e botou fogo pra coisa acontecer. 


Na próxima quarta, sete de fevereiro, elas e o cão Alvim sairão da Fonte Platina, onde a mãe de Ariela mora, rumo a Ushuaia. Mas o plano é bem mais ousado, do extremo sul do continente, o roteiro só terminará na outra borda das Américas, no Alaska. 


A Kombi amarela, totalmente adaptada, tem cama, fogão, geladeira, aquecimento, energia solar e internet via satélite. É nela, na KombiOffice, que elas continuarão o trabalho de assessoria para uma ONG. 


Como mulheres, Alice, 36, e Ariela, 33, ouvem toda hora questionamentos do tipo: “mas vocês vão sozinhas?”, “não têm medo?”, “e se a Kombi querbrar?”. Sim, há naturais medos e receios, mas nada com o poder de paralisá-las. Alice diz: "Temos medo, mas vamos em frente mesmo, pois nada nem ninguém nos impedirá por sermos mulheres."


Do Instagram delas, @dekombi_pelomundo, roubei a frase que segue: “Um dia é preciso parar de sonhar e, de algum modo, partir.”