terça-feira, 11 de agosto de 2020

Cagaço


Depois de um dia longo, calórico e etílico, resolvo aliviar a culpa pelos excessos abdicando do carro para vencer a pé o chão terroso das imediações do Coqueiro Torto à Fonte Platina.

Quase 19h e a escuridão reina na estrada sinuosa. O frio da montanha bate inclemente no meu rosto.

No meio do caminho, perto de uma ponte, algumas reses perambulam pela mesma trilha. Que diabos fazem aqueles ruminantes ali, vagando sem rumo na imensidão da noite?

Miro neles a lanterna do iPhone para sondar as reais intenções daquele pequeno rebanho. As pupilas dos bichos brilham ameaçadoramente. Sinto-os acuados e acuado eu também fico. Dois ou três touros ostentam chifres mortais. Um deles se aproxima e faz algo como se fosse um sapateado pra me botar medo. Consegue. Sou tomado por um cagaço e solto instintivamente: “Ôôôôô!”. Não sei pra que esse som serve, mas meu algoz se afasta um pouco.

Metros à frente, dois dos chifrudos resolvem brigar. Enquanto eles se enfrentam num assustador combate de cabeças, os mugidos ecoam na floresta enquanto os outros desgraçados me cercam. Achei que me fazer de estátua seria prudente. Paralisado e apavorado, senti verdadeiramente que o meu fim estava próximo. Seria, talvez, uma vingança da espécie pelas centenas de picanhas que me deleitaram ao longo da vida.

Os faróis do meu Honda —Josi ia me resgatar na Fonte Platina— jogam luz naquele ambiente tenso. Os bovinos se distanciam com o ronco do veículo. Menos aturdido, eu desisto da caminhada, me aboleto no banco do passageiro e mais convencido fico da minha total incompatibilidade com o gado. 

2 comentários:

Unknown disse...

Eu nunca ri tanto como esse dia vendo vc la parado, não sabendo o que fazer, se ia pra frente ou para trás ; olha o dia foi ótimo, mas a boiada te cercando essa foi a melhor cena que vI naquela estrada em toda minha infância naquela estrada 😂😂😂😂

Fabrícia disse...

Kkkkk, ri mto imaginando a cena!!