quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Paulo Henrique

margarina

Sujeito bacana esse Paulo Henrique. Um homem que os cronistas de antanho rotulariam como “bem posto na vida”.

É chefe de uma família que os escribas de hoje carimbariam como “família comercial de margarina”. Casado com Maria Alice há mais de década, pai de Ana Luísa e João Fernando, mora com muito conforto num condomínio fechado.

É empresário de sucesso: controla  uma agência de publicidade e uma gráfica que não param de crescer.

Religiosamente, uma vez por ano, leva a família para os parques de Walt Disney. Os filhos se acabam no Magic Kingdom e no Epcot Center, e a esposa se acaba em compras nos malls e outlets da Flórida. Também não deixa de fazer uma viagem só com Maria Alice, sempre no mês do aniversário de casamento deles —outubro— e habitualmente para destinos românticos. No ano passado, foi Paris e Saint-Paul-de-Vence, neste, será Veneza e Firenze.

Católico fervoroso, assiste às missas dominicais na igrejinha de São Bom Jesus. Adora as homílias do padre Herculano e contribui com generosidade para as obras sociais da paróquia. Sujeito bacana esse Paulo Henrique.

Valoriza muito a educação. Frequentou os melhores —e mais caros— colégios e se graduou em Administração de Empresas nos EUA —na Universidade da Pensilvânia. Pela vontade dele, Ana Luísa e João Fernando vão trilhar os mesmos passos acadêmicos que os seus.

Paulo Henrique é muito preocupado com o bem-estar dos colaboradores. As empresas pagam salários acima do mercado, bancam planos de saúde completos e a cesta básica não tem nada de básica. Nas confraternizações de final de ano, todos os contratados são presenteados sem economia. Para agradar sua equipe, ele não olha para os cifrões. Sujeito bacana esse Paulo Henrique.

Já foi um apaixonado por SUVs, aqueles veículos utilitários lindões, grandalhões e beberrões. Antenado com as questões ambientais, hoje, ele e a esposa dirigem carros menores, ecologicamente corretos. Sujeito bacana esse Paulo Henrique.

Engajado, combatente nos bons combates, Paulo Henrique participa ativamente de vários conselhos municipais que discutem saúde, segurança, educação e infraestrutura urbana da comunidade onde vive. Sujeito bacana esse Paulo Henrique.

Torcedor fanático do Brooklyn Football Club, Paulo Henrique não perde nenhum jogo do time. Vai ao estádio quando o cotejo é em casa e gruda no pay-per-view da TV quando o BFC atua fora dos seus domínios.

Paulo Henrique, sem motivo aparente, vocifera insultos racistas aos negros das equipes adversárias. Quando erram jogadas, também os atletas negros do BFC são alvos das hostilidades discriminatórias de Paulo Henrique.

A casa enorme de Paulo Henrique tem muitos empregados. Faxineira, cozinheira, jardineiro e limpador de piscina. Paulo Henrique não admite nenhum negro para estas funções.

O grupo empresarial de Paulo Henrique emprega mais de 80 pessoas. Nenhuma é negra. Paulo Henrique acha que os negros não têm aptidão para o trabalho.

No seu meio social, Paulo Henrique é exemplo de pai de família e homem bem sucedido nos negócios. A embalagem vistosa mascara um cidadão de convicções abjetas, doutrinário de segregações raciais. Sujeito escroto esse Paulo Henrique.

Um pulha, definitivamente, Paulo Henrique NÃO é um sujeito bacana.

*imagens meramente ilustrativas

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2 comentários:

Leila Borges disse...

Realmente, Lauro, Paulo Henrique não é um sujeito bacana. Vive escondido em uma casca, mas bacana é você que consegue tratar assuntos sérios , envolvendo o leitor até o final. Parabéns.

Marcelo Pirajá Sguassábia disse...

E como tem Paulo Henrique por aí... mandou muito bem, escriba! Mais uma lavra com o selo Beloca de excelência. Abraços.