quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Homo Crepuscularys

Foto: Edson Lopes Jr.

















A USP é, desde sempre, um centro de excelência em ensino e pesquisa.

E o escriba iletrado que vos fala sempre teve um baita respeito por esta magnânima academia paulista. Este respeito, agora, virou devoção.

Explico. A famosa universidade inseriu nos cursos da área de humanas uma inusitada matéria: Sanjologia.

Sanjologia, na definição da intelectualidade uspiana, estuda “assuntos mantiqueiros em geral com foco nos hábitos do 'Homo Crepuscularys'”.

O professor-doutor Joaquim José Jaguari coordena a implantação da matéria e, sem perder tempo, já perambula por estas bandas caipiras para pesquisas in loco.

Este cronista teve acesso exclusivo aos primeiros apontamentos do professor Jaguari e, também sem perda de tempo, os revela em primeira mão ao leitorado.
Reproduzo a seguir, ipsis literis, as notas de rascunho do acadêmico Jaguari.

“'Homo Crepuscularys' é o nascido em Sanja ou o que na cidade se estabeleceu e por ela criou especial afeição. Este segundo tipo, o 'Crepuscularys' por adoção, evita citar a localidade onde nasceu. A todos que o inquirem ele enche o peito e se diz sanjoanense 'desde o tempo em que a Beloca pulava amarelinha'. Para ser mais crível, ele gosta de cascatear histórias assim: 'meu pai foi pedreiro quando da construção do casarão da Rosinha do Bilu' ou 'minha mãe foi cozinheira do dom Davi Picão' ou ainda, 'meu avô foi o primeiro lanterninha do Cine Avenida'. Pura cascata. Mas uma cascata com lastro histórico.

O 'Crepuscularys' reverencia com fervor alguns símbolos da cidade. Diz ele que só em Sanja se faz bauru com lombo suíno. Saudosista, diz sempre que o melhor já passou. Cita os extintos Bar do Formiga e o Canecão do Jorge como antologias na arte baurueira. O 'Crepuscularys' da gema se orgulha das chapas pouco asseadas: 'bauru bom tem que ser feito numa chapa sujinha, assepsia de mais espanta o sabor'.
 Quando vai a Sampa de ônibus, o 'Crepuscularys' jamais menciona o nome da empresa mogimiriana que encampou o Expresso São João. O 'Crepuscularys' só vai a SP de Expressinho.

Sorvete de macaúba, guloseima-ícone da cidade, nascido das mãos hábeis da dona Angelina lá na Dom Pedro II. Há mais de 30 anos dona Angelina vendeu a sorveteria com a receita mágica. Mas o 'Crepuscularys' ainda convida: 'vamos lá na Dona Angelina tomar um sorvete de macaúba'.

'Pega a Dona Gertrudes e quando chegar na padaria da Massimina (ou seria Maximina?) vira à direita e segue reto até chegar na Transamazônica'. O 'Crepuscularys' adora referenciais sepultados —Massimina não assa pães há trocentos anos. Também gosta o 'Crepuscularys' de fazer em sua província analogias às grandes obras do país. Lá no fim dos anos 70 quando a Avenida Dr. Oscar Pirajá Martins foi aberta, a imensidão despovoada da região fez brotar a alcunha amazônica no logradouro. 'Montei na minha CB400 e dei 180 na Transamazônica'.

O 'Crepuscularys', salvo as exceções abastadas do PIB Mantiqueiro, anda meio quebradão. Mas não perde a pose. Sábado de manhã ele toma um cappuccino pequeno no Lafarrihe da Rita Yazbek, compra os jornais da cidade na Letra Viva e joga maldição no Hélio Gatti: 'Héliooo!, eu te odeio!, você teve a pachorra de fechar um bar para abrir uma livraria!'. Flana na Dona Gertrudes botando a prosa em dia e senta no Tekinfin pra bebericar um chope, só um, por três horas.

O chope é pretexto. O 'Crepuscularys' é provinciano e não quer outra coisa. Só quer ver a Sanja passar...”

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